segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Ringraziamento

Estranho como a eternidade dos momentos não pode ser medida em tempo. Ainda porque, se pudesse ser medida, não seria eterna. E nós, tão humanos, nunca fomos muito afeitos ao que não tem fim. Todos temem a morte, mas nos perguntem quem preferiria jamais morrer? Talvez as crianças o quisessem. Mas essas não contam: as crianças sabem viver. Crianças não temem a morte, por isso não a desejam - ou não a desejam, por isso não a temem? A morte é uma fronteira de segurança, o fim previsto, "a única certeza da vida". Crianças não precisam de certezas além do momento presente. Os momentos das crianças sempre são eternos, por serem sempre presentes. A vida é monopólio do presente. E só ao entendermos isso, podemos ignorar passado e futuro e viver a eternidade, sem restringir ao tempo nossa existência. Como as crianças: elas, sim, entendem.
Eu não era mais criança. Tinha por volta de 17 anos – acho. E, portanto, já poucos momentos eu percebia como eternos, como não restritos ao tempo. “Aula disso às tantas, daquilo às quantas; estudar pra isso e pr'aquilo mais; fazer assim; levar tanto; pra comer e dormir se arruma tempo; corre menino que tá chegando o vestibular"... ufa! Bom que Silvia chegou primeiro. Lá estava ela, perdida no aeroporto, com uma mala amarela enorme. Santa mala: através de sua cor tão peculiar encontramos Silvia.
Tão pouco tempo estiveram conosco - ela e sua mala. Um fim de semana. Algumas horas a mais, talvez... e daí?! E se foi menos tempo, menos dias? E se apenas a vimos no aeroporto, ou nem isso, se eu tiver encontrado com uma italiana qualquer, ou visto uma mala amarela passeando no saguão ou... e se eu apenas sonhei que uma italiana nos visitava? Não, sonho sei que não foi. Através de um intercâmbio de medicina em que minha irmã se inscrevera, Silvia esteve conosco, mas não vou dizer por quanto tempo. Não seria justo, pois foi ela quem me fez reaprender que os momentos são belos por serem da alçada da vida, não do tempo.
Eu nem falava italiano. Entendi pouquíssimo do que Silvia disse àqueles dias, a não ser quando meu pai se punha a traduzir. Silvia, por sua vez, se foi sem aprender mais que "bom dia" e "obrigada" em português. Logo, foi somente através de meu pai que pude saber do e_mail enviado por ela e da parte em que falava de/para mim.
Em meio às tribulações dos ponteiros do relógio, jamais pensei que ela teria feito uma leitura tão precisa de mim. E, no e_mail, era exatamente disso que ela falava, do tempo escasso e da minha paixão maior – pela literatura. Pra Vítor, Silvia escreveu:

"(...)e dice a lui che non deve mai dimenticare il suo pezzo di giardino."

Não sei se ela o disse com essas palavras exatas. Mas a exatidão das palavras é o que menos importa: nem italiano eu sabia! Sabia que ela falava da vida, de sua beleza e de como não se restringia ao tempo. Falava dos momentos, meus momentos, do que realmente importa. Dizia pra eu "jamais esquecer meu pedaço de jardim", meu resquício de infância, a parte da vida em que eu podia viver, em que meus momentos não se limitavam pelos ponteiros do relógio.
Daí, passei a escrever.

Grazie, Silvia. Grazie mille!

4 comentários:

  1. muito grande heauheuaheuaheuaeh xD
    Dr.!!!!!

    vou imprimir pra ler com calma xD

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  2. desde aí você não esqueceu mais seu pedacinho, sempre posso vê-lo com você, ou em você ou através de você.

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  3. Vitor,
    Que belo, que belo.
    Agora sim esta tudo explicado. Explicado de uma maneira muito bonita. Como não poderia deixar de ser... afinal foi você quem escreveu. E como sempre... Perfeito, maravilhoso!

    Abraço,
    CCNFF!

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